Uma das piores sensações para um profissional é, depois de um ano de muito esforço, não ser reconhecido como deveria. Infelizmente, isso acontece com frequência. Não porque os gestores sejam ruins ou as organizações sejam más. O problema é que a maioria das empresas ainda utiliza modelos de gestão de performance ineficientes, que comparam pessoas com base em critérios falhos e obsoletos para um mundo volátil. As avaliações funcionam como instrumentos de desengajamento e não identificam talento algum. O resultado é que poucos celebrem, enquanto muitos se frustram. Neste fim de ano, com uma epidemia que estressou a relação de muitos com o trabalho, essa realidade está ainda mais latente.
Nos últimos cinco anos, a “Revolução da Gestão de Performance” (termo baseado em um dos artigos mais lidos da Harvard Business Review) mudou a realidade em empresas, que resolveram eliminar as limitações das avaliações de performance predominantes. A lista dessas limitações é vasta: quem avalia é influenciado por fatos recentes ignorando o resto do ano, preferências pessoais predominam sobre dados, o fato de apenas 10% a 20% receberem uma boa avaliação enquanto a maioria se frustra, metas que são estabelecidas de formas a beneficiar quem as manipula, entre muitas outras. Resumindo, é um processo que mobiliza toda a organização e acaba gerando mais frustração e desengajamento do que desenvolvimento, aprendizado e resultado.
Os novos modelos adotados convergem na realização de conversas mais frequentes para compreender o que está acontecendo e desenvolver os profissionais em direção ao que precisam entregar. A lógica é: conversa sobre performance deveria ser frequente, orientada em construir e realizar, não destruir. As companhias que conseguiram implementar modelos orientados ao aprendizado e execução estão tendo respostas positivas para lidar com todas as mudanças de postura e mentalidade exigidas pela pandemia. Porém, elas ainda são minoria.
Em um ano de Covid-19, a frustração deverá ser ainda maior para os profissionais que trabalham em organizações que não atualizaram sua maneira de avaliar. A sensação mostrada por pesquisas é que, em 2020, o dia ficou mais longo e exaustivo. O que antes era tempo para deslocamento, almoço ou academia foi absorvido por extenuantes reuniões virtuais realizadas no espaço antes usado como lar. Tudo para não deixar o resultado escorregar.
Os líderes deveriam demonstrar gratidão e não ampliar a frustração julgando o que poderia ter sido feito melhor. Pais e mães (principalmente elas) com filhos em idade escolar são vítimas fáceis de uma queda no ranking de talentos pela lógica das avaliações tradicionais, como se o potencial sumisse. É preciso analisar o contexto. O Google decidiu suspender os processos de gestão de performance neste ano.
Para os executivos que adotaram a máxima de que a única certeza é a incerteza, 2020 deveria ter sido um ano de aprendizado. Excluindo as companhias que entregaram mais resultado por se beneficiarem de um contexto favorável (como empresas de videoconferências, comércio eletrônico, delivery, entre outras), a maioria das organizações terá declínio de receita e lucro no ano em que muito dos seus profissionais deram o melhor de si, considerando todas as limitações de mercado e dificuldades.
Não conseguir enxergar esse paradoxo é desconhecer o que é e como se desenvolve talento. Infelizmente, essa ainda é a realidade de muitas empresas, com sistemas de gestão antiquados, reforçados pelas crenças de seus líderes e conselhos de administração que ainda privilegiam avaliar e selecionar ao invés de desenvolver e colaborar.
Fonte: Valor Econômico - Cláudio Garcia, professor adjunto de gestão global na Universidade de Nova York. |