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8 de dezembro de 2022 - Ano 13 - Nº 706
Carreira
 

O perfeccionismo está longe de ser a chave do sucesso
Importância de assumir vulnerabilidades e ter coragem de ser imperfeito

Enquanto quase todo mundo que conheço já havia tido Covid, eu passava ilesa. Pois desta vez a doença me pegou e eu, em vez de me sentir humana, me senti derrotada. Não parei de pensar que falhei nos cuidados, que poderia ter evitado, que deveria ter usado máscara naquele evento. Fiquei depois pensando no quanto a gente se idealiza e acredita ser diferente dos outros. Que conosco não vai acontecer nada de ruim. Alimentamos muitas vezes uma falsa sensação, embutida de certa arrogância, de que as coisas deram certo até agora simplesmente porque fizemos tudo certo, porque nos preparamos. Até que num certo dia um tsunami nos atinge e nos deixa sem rumo.

É fácil transpor esse sentimento para o ambiente profissional porque há lideranças que se acham imbatíveis. Profissionais que nunca tiveram um fracasso em suas carreiras podem desenvolver uma autoconfiança perigosa ao acreditar que chegaram aonde estão por competência, mérito e acerto de suas escolhas e que sempre será assim.

Há milhares de livros, cursos e manuais disponíveis que explicam o que um líder deveria ter ou fazer para alcançar o sucesso. "Faça uma boa faculdade, um MBA de primeira linha, se exponha a diferentes setores ao longo da carreira, desenvolva uma especialidade, busque novos conhecimentos, construa um networking eficiente, aprenda a trabalhar em equipe, tenha um propósito. Faça tudo certo e você chegará lá". Daí você, a partir de uma somatória de fatores como dedicação, competência, sorte e privilégios, segue os passos, faz a sua lição de casa e de fato conquista tudo o que almejou.

Mas pode ter certeza de que em algum momento virá a vida, essa sábia anciã, e ensinará que não é bem assim. Exercícios físicos, boa alimentação, exames preventivos, uso de máscara e vitaminas em dia não garantem que nunca ficaremos doentes, assim como seguir a cartilha de Harvard não vai garantir que falhas e injustiças também nunca acontecerão.

Me lembrei do texto que eu escrevi há pouco mais de um ano nesta coluna, sobre como lidamos com vulnerabilidades no ambiente de trabalho. A nossa sociedade sempre enalteceu comportamentos tóxicos e não ensinou (de verdade) sobre tolerância a erros e falhas. Mulheres da minha geração, para conseguirem se posicionar e serem respeitadas no ambiente de trabalho, tiveram de "agir como homens", se preparando para terem sempre as respostas certas, serem assertivas e não demostrarem emoções.

Uma pesquisa realizada pela escritora norte-americana Brené Brown para o livro A coragem de ser imperfeito mostra que o perfeccionismo está longe de ser a chave do sucesso. "O medo de falhar, cometer erros, de não corresponder às expectativas dos outros e de ser criticado mantém o perfeccionista fora da arena da vida, onde a competição e o esforço saudável se desenrolam", escreveu. Quando me senti fracassada por ter sucumbido à Covid, na última semana, caí na armadilha que Brown escreveu: "Quando assistimos alguém mostrando suas vulnerabilidades, tendemos a ver como coragem. Mas quando acontece com a gente, enxergamos a vulnerabilidade como fraqueza."

Eu, que tanto falo sobre o lado humano das pessoas, agi internamente como se eu não pudesse ter errado. Fui cruel comigo. Essa história de ser humano todos os dias dá trabalho! Temos de aprender a sermos mais generosos conosco, a assumir nossas vulnerabilidades e acolher as emoções que derivam desse processo. Vou repetir para mim mesma o que escrevi há um ano: "A tentativa de nos mostrarmos como heróis nos causa doenças".

Fonte: Valor Econômico – Vicky Bloch.