Você provavelmente já se deparou na internet com vídeos de jovens dizendo que fazer faculdade não está nos planos de futuro deles. Seduzidos pela vida de influenciador digital ou pelo caminho do empreendedorismo, muitos abandonam a meta de ingressar no ensino superior.
Com tantas possibilidades, surge o questionamento: ainda vale a pena fazer faculdade?
A resposta é sim. Conversei com especialistas que explicaram por que ter um diploma é vantajoso para o mercado formal - e também para outras modalidades de carreira.
Antes, vamos voltar algumas casas. O que explica esse discurso contra a educação? Não existe uma só resposta, mas alguns fatores podem influenciar. São eles:
- Extremismo: no caso de influenciadores digitais, por exemplo, a internet passa a falsa impressão de que todos são bem sucedidos. A juventude, porém, tende a olhar os extremos e esquecer das médias, diz Janaína Feijó, pesquisadora da área de Economia Aplicada da FGV Ibre;
- Imediatismo: no caso de carreiras tradicionais no mundo corporativo, não há uma ascensão tão acelerada, o que pode desanimar jovens que buscam ganhar dinheiro e prestígio de forma rápida.
E o que a faculdade tem a ver com isso? Alguns estudos mostram que ter um diploma de graduação ajuda a ganhar mais.
A FGV IBRE (Instituto Brasileiro de Economia da Faculdade Getúlio Vargas) analisou a diferença salarial entre trabalhadores com ensino superior completo e aqueles com outros níveis de escolaridade no Brasil.
Foram usados modelos estatísticos para poder estimar a diferença do salário-hora entre trabalhadores com diploma de graduação e os que não têm. A pesquisa comparou o mesmo trimestre de 2012 e 2024.
O que foi observado?
Em 2012, trabalhadores com 16 anos ou mais de estudo (aqueles com faculdade completa) ganhavam em média 152% a mais do que aqueles com 12 a 15 anos de estudo (ensino médio completo e/ou com superior incompleto). Em 2024, essa porcentagem caiu: a média agora é de 126%.
Ainda assim, a pesquisadora classifica essa diferença como expressiva, já que pessoas que finalizaram a graduação recebem mais que o dobro do que aquelas que têm apenas o ensino médio completo. Existem alguns fatores que explicam a queda desse percentual. O primeiro, de acordo com Feijó, diz respeito ao ingresso nas faculdades.
Nos últimos 20 anos, nós tivemos várias políticas para que as pessoas pudessem acessar o ensino superior", exemplifica.
Com isso, houve um aumento da parcela da população mais escolarizada e da mão de obra mais qualificada. Atualmente, há maior oferta de pessoas com diploma disponíveis, o que diminui o salário oferecido pelas companhias. O diploma já "não é um bem tão escasso", nas palavras da pesquisadora.
Outra explicação está no aumento da informalidade entre os mais escolarizados. Segundo Feijó, houve uma alta de 14% para 19,3% do total de indivíduos nesta posição.
“Não basta você ter o ensino superior, você tem que estar no mercado de trabalho formal para isso poder ter um impacto mais expressivo na sua renda", diz.
E qual a conclusão do estudo?
Ainda é vantajoso ingressar no ensino superior. O grau de instrução é um fator relevante na determinação da remuneração.
Sem faculdade, é mais difícil acessar boas oportunidades no mercado de trabalho, além de dificultar a ascensão para posições estratégicas, como diretores e CEOs de empresas.
A pesquisa também apresenta um estudo do FMI (Fundo Monetário Internacional) que mostra que trabalhadores com ensino superior têm maior probabilidade de se adaptar à IA (inteligência artificial). A pesquisadora explica que as ferramentas possuem um caráter de complementaridade para quem possui um nível educacional mais elevado.
“Uma pessoa que tem ensino superior já passou por um ciclo educacional bem extenso, já foi exposta a fazer trabalhos, redações, diversas coisas a fizeram desenvolver uma capacidade, e isso também faz com que ela consiga utilizar de melhor forma as tecnologias que estão disponíveis e as que estão por vir", diz.
A pesquisa aponta vantagens também da formação para quem quer empreender. A graduação pode ajudar na hora de criar uma bagagem teórica, explica Lilian Cidreira, professora da ESPM e mentora de carreiras.
“O conhecimento empírico você aprende na prática. E se você quer crescer, você vai precisar ter um conhecimento para além do que você sabe executar", exemplifica.
Mas…
O diploma não é tudo. Por muito tempo, ele foi um sinalizador da qualidade e capacidade dos indivíduos, pontua Feijó. Porém, como a pesquisa mostrou, o número de pessoas com ensino superior completo aumentou nos últimos 20 anos, o que significa que há mais indivíduos formados no mercado de trabalho.
Então, o que fazer para se destacar em uma seleção? Para a pesquisadora, é importante aprimorar suas habilidades socioemocionais (ou soft skills, como também são conhecidas).
Além disso, as especialistas reforçam a importância de adquirir experiências extracurriculares durante a graduação. Estudantes que participam de atividades nas áreas de ensino, pesquisa, extensão e estágio desenvolvem habilidades que podem ser incorporadas ao currículo.
“Muitas vezes nas universidades públicas, nós temos monitorias voluntárias. Às vezes, o aluno não quer pegar porque não é remunerado, e mal sabe ele que aquilo pode ajudar no currículo dele", relata Feijó.
Cidreira acredita que essas vivências também podem ajudar os indivíduos a colocarem em prática o que aprendem em sala de aula. Estágios na faculdade e empresas júnior, por exemplo, são indicações da mentora de carreiras para que você tenha experiências semelhantes às profissionais antes mesmo de ingressar no mercado.
Fonte: Folha de S.Paulo – Beatriz Pecinato. |